Urubu de estimação
-Nossa, como ele voa bonito, pai!
O menino tinha gostado do urubu. Fosse
pelo voo, onde a ave fica planando com suas asas em desenho ao céu, fosse pela
aterrissagem, onde usa recursos que a física bem explica, além da envergadura
que atribuía ao animal grande imponência, o fato foi que queria um urubu como
animal de estimação.
-Mas filho, esses animais não nasceram
para ficarem trancados!
-Nenhuma ave né, pai!
-Sim, mas eles não são animais domésticos,
não servem para ficarem em casa, para você passear com eles, essas coisas...
Ora, bolas! Mike Tyson possuía tigres, Emerson Sheik um macaquinho, ele só
queria um urubu... Sempre teve apego as aves: aliás, o urubu se parecia, um
pouco é verdade, com um falcão, só que não caçava, mas sim limpava os lugares
com sua tarefa. Alguém tem que fazer o serviço sujo, e nem por isso menos
importante.
O menino ficou emburrado. Pensou em
argumentos possíveis para rebater o pai.
-Pai, mas como você sabe disso?
-Disso o que Vitor?
-Disso, que os urubus não servem para
serem animais de estimação?
-Ué, quem você conhece que tem urubu
em casa?
-Ninguém!
-E então? O pai já estava sem
paciência.
- Ah pai, isso não é lógico!
- Como assim? Por que não é lógico?
-Bom, todo mundo fala que temos que
comer comida saudável, mas nossa família come 10 pizzas por mês afim de trocarmos
os tickets que vem nas caixinhas pela décima primeira, porque é grátis; todo
mundo fala que as famílias precisam distinguir suas prioridades daquilo que é
supérfluo, mas a mamãe tá sempre no vermelho por causa daquilo que ela já tem; todo
mundo fala que é importante reciclar o lixo, mas até agora já passamos por
quatro quiosques e não vi nenhuma lixeira reciclável. Não acho que entre o que
se fala e entre o que de fato é haja uma forma segura, realidade palpável,
verdade inquestionável...
O pai olhou o filho com espanto.
Estava feliz de saber que ele tinha, mesmo que para um pedido estranho,
reflexão e poder de persuasão. Apenas treze anos e com esse senso crítico, que
maravilha! As aulas de redação da professora Elaine realmente estavam fazendo
efeito.
Pensou nas bordas da pizza, que
ninguém da família comia. Um urubu não seria mal ideia. Mas tinha que ser
filhote! Afinal, pelo menos pro lixo orgânico, a coisa já estaria resolvida.
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