terça-feira, 4 de março de 2014

Urubu de estimação
                                   
-Nossa, como ele voa bonito, pai! 
O menino tinha gostado do urubu. Fosse pelo voo, onde a ave fica planando com suas asas em desenho ao céu, fosse pela aterrissagem, onde usa recursos que a física bem explica, além da envergadura que atribuía ao animal grande imponência, o fato foi que queria um urubu como animal de estimação.
-Mas filho, esses animais não nasceram para ficarem trancados!
-Nenhuma ave né, pai!
-Sim, mas eles não são animais domésticos, não servem para ficarem em casa, para você passear com eles, essas coisas...
Ora, bolas! Mike Tyson possuía tigres, Emerson Sheik um macaquinho, ele só queria um urubu... Sempre teve apego as aves: aliás, o urubu se parecia, um pouco é verdade, com um falcão, só que não caçava, mas sim limpava os lugares com sua tarefa. Alguém tem que fazer o serviço sujo, e nem por isso menos importante.
O menino ficou emburrado. Pensou em argumentos possíveis para rebater o pai.
-Pai, mas como você sabe disso?
-Disso o que Vitor?
-Disso, que os urubus não servem para serem animais de estimação?
-Ué, quem você conhece que tem urubu em casa?
-Ninguém!
-E então? O pai já estava sem paciência.
- Ah pai, isso não é lógico!
- Como assim? Por que não é lógico?
-Bom, todo mundo fala que temos que comer comida saudável, mas nossa família come 10 pizzas por mês afim de trocarmos os tickets que vem nas caixinhas pela décima primeira, porque é grátis; todo mundo fala que as famílias precisam distinguir suas prioridades daquilo que é supérfluo, mas a mamãe tá sempre no vermelho por causa daquilo que ela já tem; todo mundo fala que é importante reciclar o lixo, mas até agora já passamos por quatro quiosques e não vi nenhuma lixeira reciclável. Não acho que entre o que se fala e entre o que de fato é haja uma forma segura, realidade palpável, verdade inquestionável...
O pai olhou o filho com espanto. Estava feliz de saber que ele tinha, mesmo que para um pedido estranho, reflexão e poder de persuasão. Apenas treze anos e com esse senso crítico, que maravilha! As aulas de redação da professora Elaine realmente estavam fazendo efeito.  
Pensou nas bordas da pizza, que ninguém da família comia. Um urubu não seria mal ideia. Mas tinha que ser filhote! Afinal, pelo menos pro lixo orgânico, a coisa já estaria resolvida.


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