sábado, 7 de janeiro de 2017

Quando eu era romântica

Sonhei, eu quis pra mim
A vida sempre ao teu lado

E o passado
Não é presente, escasso
o beijo ausente, a cama fria.

O futuro,
imagem fugidia.

A agonia é uma fêmea louca.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Ir ao show do Morrissey fez todo sentido para mim: poesia, dramaticidade e afirmação da existência são alguns dos conceitos que sempre apreciei e isso tudo aconteceu na apresentação do último sábado. Foi um reencontro de um amor adolescente. Eu era fã de Renato Russo, que dizia ter um grande sonho de conhecer o vocalista inglês, foi assim que acabei chegando até esse. O preâmbulo do show começou na voz de uma cantora (se alguém souber quem é, por favor me diga) que anunciou o tom da noite. A apresentação misturou imagens e vídeos as canções numa concomitância exacerbada, lírica, melancólica: vídeos de violência de policiais, onde a nitidez de alienação desses mostraram como podemos nos deixar levar por ideologias extremistas (olha aí o sufixo ISTA...). A pior parte foram os vídeos de matança animal para consumo, horripilantes, chocantes, estilo Lars von Trier, anunciados por falas como "com mais de oitenta divindades na Terra, nenhuma delas conseguiu salvar os homens". Muitas imagens eram flamencas, dialogando com canções latinas, cantadas inclusive em espanhol pelo violeiro da banda. Sim, Morrissey foi gentil com os músicos, deixou espaços para cantaram, solarem, apresentarem-se. Para o público, somente ele. Quando alguém da plateia resolveu tietar dando um berro, simplesmente ouviu "Do you need a microphone?". Era a hora e a vez de Morrissey neste momento brilhar com uma canção com apenas voz e violão. A gentileza do músico para com o público foi isso, sua performance: que voz!!! Estava afinado, preciso, cortante. Quanta vitalidade também. Ao final, até tirou a camisa, deixando aparentar que em meio aos problemas de saúde, a música o mumificou. Uma lenda que consegue oferecer um show incrível, tocando apenas uma música dos Smiths. O show foi do Morrissey, o show era o Morrissey e confesso: lágrimas rolaram diante de tanta beleza, exuberância e força. E está tudo até agora, ressoando, existindo, cantando...



 

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Mas tem dias que o externo não convence meus pensamentos. A vulnerabilidade chega, ou melhor, desadormece. Mostra-se triunfante, dona de tudo, filha da puta.

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Vida: livro em branco, vai se enchendo de sentido conforme o caminho por sua ponte simultânea ao caleidoscópio de imagens e paisagens, nada é sólido, átomos estáticos, vazam-se por entre os poros, entranhas, buracos e ao alcance da visão todas as certezas, todas, malditas, por que não me acostumei com a verdade, por que tanta ilusão, pra que fazer da vida algo tão fabulosamente diferente daquilo que se apresenta, nem sei se você ao menos existe, isso que você tem eu não sabia, e o que penso ter nunca foi teu: meus deus, o que é real?

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

SICUT ENIM HODIE , PANEM ET CIRCENSES

Ir a primeira vez ao circo com trinta e dois anos(!) é sentir-se, de certa forma, como o cavaleiro Anthonyus Block ( Max Von Sydon) do filme “O Sétimo Selo”, de Ingmar Bergman.
Não que eu não encontre mais sentido na vida e, de repente, o circo e coisa e tal. Mas sabe, é interessante pensar nessa arte quase como uma forma de resistência a toda transformação voraz que nossa atual sociedade vive: ao longe, a grande tenda com suas as lâmpadas tipo “bolinhas” chamaram minha atenção para essa maneira reconhecível desde sempre.
Ao chegar na bilheteria e adentrar no interior do espetáculo, homens barbudos fumando e conversando perto de seus trailers: uma olhadela mais curiosa para saber o que pessoas de lugar nenhum carregam: bom, além do normal, o necessário. Nada de tvs 56 polegadas, closet para as roupas, espaços divididos num lar que deve sempre unir. Volte e meia o essencial é realmente invisível aos olhos!
O palco era modesto em tamanho, a plateia intimista em relação a esse. Enfim, a sensação de ficar perto me fez perceber cada movimento, cada detalhe nas roupas, cabelos, maquiagem; imaginar as horas e horas que cada artista se submeteu para executar seu número foi um dos meus pensamentos; ressignificar o que acho difícil às vezes desempenhar foi outro. O corpo, cheio de possibilidades, pode ensinar aos pensamentos que esses também podem flexibilizarem-se.
Eu acreditei em tudo: no ciclista que diversas vezes brincou de desequilibrar-se em bicicletas impensáveis (desmontáveis, tortas, de todos os tamanhos) aos palhaços que fingiram me sujar com ovos que estavam “grudados” na travessa por um cordão que também fingiram perder o equilíbrio; na contorcionista e seu suposto destroncamento de membros ao mágico com seus truques (uns desvendáveis por uma parte do cérebro que insiste em raciocinar e outros que ficaram no insólito do absurdo -não quero pensar sobre esses outros, ponto!); os malabaristas, precisos, concentrados, presentes. O circo é um agora constante...
Fui toda levada pelos sons em meios ao gestos, pelas luzes em meio a música, pelos sorrisos fáceis. Como fui relapsa para rir ontem. Como me deixei conduzir por minhas palmas espontâneas, minha mão levada à boca aos sustos torrenciais; os suspiros, ar repentino que levamos ao coração em catarse.
Senti-me como Anthonyus porque um dia perderei para a morte, mas meus olhos serão, assim como os do cavaleiro ao experimentar algo significativo na vida antes de morrer, de uma felicidade imensa por ter visto, dentre outras coisas, tal espetáculo.
Sou essa porção menina que muitos falam mais pelo o que não vivi do que insisto em não deixar ir embora.



quarta-feira, 17 de junho de 2015

Anda para não perder a cabeça

Ela tinha um andar diferente. Embora a carne não preenchia muito as roupas, faltava mais alguma coisa. O passo conforme o segundo, o corpo inclinado, a pressa. Isso, a coisa mais estranha de tudo é que faltava a pressa. Em forma de ritmo, não necessariamente a pressa em segundo, porque também já tinha idade mais avançada. Aquela pressa-destino, pressa-para-não-perder-tempo, pressa porque eu preciso chegar, resolver, fazer, limpar, decidir, ouvir, dizer, receber, entregar, pagar, assistir, contar, abraçar, pressa-para-morrer mais convicta, para amar, para sofrer.
Enfim, não tinha nada. Esvaziada de sentidos, símbolos, coberta dos instintos mais primitivos ela caminhava. Estava vestida sim, e se apoiava na bolsa, o corpo ao compasso molenga, sacudido, tinta no cabelo. Ela andava e tascava na minha cara “por que que é que a gente se deixa, hein?”. Incomodei-me com a falta de tudo.
Assim, passei por ela. E seu olhar tinha tanto! Por um momento não foram as histórias cosmogônicas mas aquela mulher, aquela mulher que me fez sentir ridícula, ínfima, pouco. Foi seu nada, sua divagação inerente em pleno meio-dia, sua falta de compromisso, de pressa, de preocupações, mas somente sua locomoção vagarosa, vertiginosa, obtusa que publicamente fazia ser que me fez rever.
Tive raiva, ódio, indignação! Achei-me sôfrega ao comparar meu andar, tão consonante com minhas ideias, tão expoente de minha auto percepção. Se ao menos eu dançasse, se ao menos eu sorrisse, se ao menos eu não ficasse me perguntando tanto, mas apenas fizesse  o mesmo.
E por isso indignação: eu conseguiria transcender meu andar em todas as esferas que permeiam minha alma. Eu seria sopro. Mas hoje eu sou magma.

sábado, 25 de abril de 2015

O caminho da crônica

                                                                                                                                     Ana Paula Moraes

Os pequenos sons balbuciam a levada do dia e me deixam constrangida de dormir mais. Há sol lá fora. Então, como quem ritualisticamente se espreguiça ou toma água quando acorda, pego minha caneta e folha em branco. Em tempos digitais, faço à moda antiga, sou romântica e jovem. Desço a rua de casa e lá, longe, vejo prédios despontando que continuam para mim a anunciar o futuro.  
Em contraste com o céu, azul, azul, uniformemente pintado, sem vacilos, desproporções, é a vida pois, contínuo a descer ruas e desta vez atento-me para o fato de morar em uma espécie de vale e que desejo saber seu outro lado. Porque mistério é aquilo que meus olhos veem ao longe, mas meu corpo fica. Ah, as estrelas: avisam a gente todos os dias que tudo é muito, muito além-daqui-agora.
Atravesso uma ponte, lembrando que morria de medo de atravessá-la quando era pequena junto de mamãe: tinha medo de que ela caísse e fosse embora. E eu, que não sabia e não sei nadar, teria de me conformar com aquilo que eu ainda não poderia e não posso.
Encontro a rua, um portal de árvores. É como se tudo já existisse: é como se este lugar fosse um polo magnetizador, me atraindo para o indeterminável. E lá, bem ao fundo, encontro-me: uso uma camiseta branca, calça preta, sapatilha. Estou com a mesma caneta, folhas tiradas do mesmo caderno, mexendo os lábios, pois falo sozinha, ontem e amanhã. Chego mais perto e sim, sou eu! De tudo igual agora, menos a tonicidade da pele: sou eu com peles flácidas, as gorduras moles, mais pintas. Aos nos olharmos, reconhecemo-nos. Os olhares são idênticos, além da roupa e dos objetos. E desse, reconhecemos também que nossa história, tão intensa e cheia, é passageira. E é de crônica que vamos escrevendo exatamente a cena que agora dividimos: ela já não se pergunta, enquanto eu hoje persisti no mistério.

Ambas querem ocupar o lugar uma da outra. As folhas caem ao nos abraçarmos, sequenciando a história de nossas vidas: minha última crônica será sobre o dia que encontrei comigo mesma e soube do que era.