segunda-feira, 24 de agosto de 2015

SICUT ENIM HODIE , PANEM ET CIRCENSES

Ir a primeira vez ao circo com trinta e dois anos(!) é sentir-se, de certa forma, como o cavaleiro Anthonyus Block ( Max Von Sydon) do filme “O Sétimo Selo”, de Ingmar Bergman.
Não que eu não encontre mais sentido na vida e, de repente, o circo e coisa e tal. Mas sabe, é interessante pensar nessa arte quase como uma forma de resistência a toda transformação voraz que nossa atual sociedade vive: ao longe, a grande tenda com suas as lâmpadas tipo “bolinhas” chamaram minha atenção para essa maneira reconhecível desde sempre.
Ao chegar na bilheteria e adentrar no interior do espetáculo, homens barbudos fumando e conversando perto de seus trailers: uma olhadela mais curiosa para saber o que pessoas de lugar nenhum carregam: bom, além do normal, o necessário. Nada de tvs 56 polegadas, closet para as roupas, espaços divididos num lar que deve sempre unir. Volte e meia o essencial é realmente invisível aos olhos!
O palco era modesto em tamanho, a plateia intimista em relação a esse. Enfim, a sensação de ficar perto me fez perceber cada movimento, cada detalhe nas roupas, cabelos, maquiagem; imaginar as horas e horas que cada artista se submeteu para executar seu número foi um dos meus pensamentos; ressignificar o que acho difícil às vezes desempenhar foi outro. O corpo, cheio de possibilidades, pode ensinar aos pensamentos que esses também podem flexibilizarem-se.
Eu acreditei em tudo: no ciclista que diversas vezes brincou de desequilibrar-se em bicicletas impensáveis (desmontáveis, tortas, de todos os tamanhos) aos palhaços que fingiram me sujar com ovos que estavam “grudados” na travessa por um cordão que também fingiram perder o equilíbrio; na contorcionista e seu suposto destroncamento de membros ao mágico com seus truques (uns desvendáveis por uma parte do cérebro que insiste em raciocinar e outros que ficaram no insólito do absurdo -não quero pensar sobre esses outros, ponto!); os malabaristas, precisos, concentrados, presentes. O circo é um agora constante...
Fui toda levada pelos sons em meios ao gestos, pelas luzes em meio a música, pelos sorrisos fáceis. Como fui relapsa para rir ontem. Como me deixei conduzir por minhas palmas espontâneas, minha mão levada à boca aos sustos torrenciais; os suspiros, ar repentino que levamos ao coração em catarse.
Senti-me como Anthonyus porque um dia perderei para a morte, mas meus olhos serão, assim como os do cavaleiro ao experimentar algo significativo na vida antes de morrer, de uma felicidade imensa por ter visto, dentre outras coisas, tal espetáculo.
Sou essa porção menina que muitos falam mais pelo o que não vivi do que insisto em não deixar ir embora.



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