Gente espelho da vida doce mistério*

 Para mim não tem melhor palavra que defina a relação entre um professor e seu aluno: inspiração! Quando estou em aula, quero deixar um pouco do meu melhor em meu educando; contar-lhe uma interessante estória que conheço, que também ouvi de alguém, que li ou melhor ainda, que vivi! Quero olhá-lo nos olhos e indagá-lo, inquietá-lo, fazê-lo recobrar-se de sua consciência, esse inebriante estado psíquico povoado pela busca, respostas. A reciprocidade é, na mesma medida, verdadeira e real: esvazio minha mente para inflá-la novamente com a devolutiva dos estudantes, que pontuam meus ditos, contando também suas experiências, questionando minhas afirmativas, respondendo minhas provocações.

Nesta última sexta-feira fui à formatura dos meus alunos do “Clube do livro” e da “EJA” da Prefeitura de São Paulo. Interessante ver como o discurso econômico-determinista-burocrático-fatalista faz com a escola pública brasileira: sim, nós temos muitos problemas, mas os menos culpados são os alunos. (ponto) Foi bonito vê-los arrumados, ensaiados, cantando e discursando - com direito a anel de formatura e tudo-.

Os rituais são atemporais e marcam uma passagem importante. Portanto, não importa os moldes nos quais estejam, suas mudanças: a simbologia que representam é significativa, agregando valores, experiências, ajudando a dar o tom da vida, tela branca que se preenche até o último suspiro.

Pois bem, em meio ao encanto da festa, fui despedir-me de dois alunos nos quais despertaram justamente em mim uma admiração incrível: Taylor e Ana Karoline.

Nossa, meu choro em nenhum momento foi de felicidade, mas sim de pura tristeza, de perda, oh dor insuportável! Ficaria com eles por mais dez anos, uma vida inteira,  ouvindo seus papos, furtando, sem que percebam, a jovialidade e frescor de seus risos, piadas, seus dramas juvenis; voltando ao passado em que tinha a mesma idade e sentindo orgulho por ser professora de seres tão bacanas.

As leituras de livros e filmes tão instigantes, as horas de comilanças, as guerras de almofadas...de limpeza de pele a sessões de cambalhotas; de gritos de sustos a lágrimas de desentendimentos pessoais...Inspirações e aspirações daqueles que são jovens, na relatividade de tudo.

Não fomos um dia embora sem que nos despedíssemos um do outro com abraços, risos, promessas de presença no próximo encontro.

Meus queridos: eu reafirmei minha profissão, no seu sentido legítimo de transformação e sinto o quanto é extraordinária essa coisa de imprimir-se no outro.  Nossa história não está nos livros, nos trabalhos acadêmicos, filmes. Ela é nova, como esse presente momento, nunca dantes acontecido.

Obrigada por me fazerem viver algo improvável que é amá-los não por serem apenas gente, mas por aquilo que eu não tinha antes de conhecê-los. E justamente pela beleza de serem também mistério.

 *Gente – Caetano Veloso